sábado, 24 de outubro de 2009

A descoberta do amor por Clarice Lispector...



“[...] Quando criança, e depois adolescente, fui precoce em muitas coisas. Em sentir um ambiente, por exemplo, em apreender a atmosfera íntima de uma pessoa. Por outro lado, longe de precoce, estava em incrível atraso em relação a outras coisas importantes. Continuo, aliás, atrasada em muitos terrenos. Nada posso fazer: parece que há em mim um lado infantil que não cresce jamais.

Até mais que treze anos, por exemplo, eu estava em atraso quanto ao que os americanos chamam de fatos da vida. Essa expressão se refere à relação profunda de amor entre um homem e uma mulher, da qual nascem os filhos. [...] Depois, com o decorrer de mais tempo, em vez de me sentir escandalizada pelo modo como uma mulher e um homem se unem, passei a achar esse modo de uma grande perfeição. E também de grande delicadeza. Já então eu me transformara numa mocinha alta, pensativa, rebelde, tudo misturado a bastante selvageria e muita timidez.

Antes de me reconciliar com o processo da vida, no entanto, sofri muito, o que poderia ter sido evitado se um adulto responsável se tivesse encarregado de me contar como era o amor. [...] Porque o mais surpreendente é que, mesmo depois de saber de tudo, o mistério continuou intacto. Embora eu saiba que de uma planta brota uma flor, continuo surpreendida com os caminhos secretos da natureza. E se continuo até hoje com pudor não é porque ache vergonhoso, é por pudor apenas feminino. Pois juro que a vida é bonita.”


Um pouco sobre Clarice:

Clarice Lispector, nascida Haia Lispector (Chechelnyk, 10/12/1920 — Rio de Janeiro, 09/12/1977), foi uma escritora brasileira, nascida na Ucrânia. Chegou no Brasil quando tinha dois meses de idade. Faleceu um dia antes de seu 57° aniversário vitimada por uma súbita obstrução intestinal, de origem desconhecida que, depois, veio-se a saber, ter sido motivada por um adenocarcinoma de ovário irreversível.

Embora tenha se formado em Direito, Clarice Lispector nunca advogou, sobrevivendo basicamente do jornalismo e, acessoriamente, dos trabalhos de tradução. Em 1940, quando ainda cursava a faculdade, ela ingressou no Departamento de Imprensa e Propaganda para exercer, em princípio, a função de tradutora, mas findou sendo redatora da Agência Nacional. Sua primeira reportagem, “Onde se ensinará a ser feliz”, foi publicada em 19 de janeiro de 1941, no Diário do Povo, de Campinas (SP), relatando a visita da primeira-dama da República, Darcy Vargas, a um orfanato feminino. No ano seguinte, ela começou a trabalhar como redatora de A Noite e obteve seu registro profissional como jornalista, profissão que exerceria até dois meses antes de falecer, com o hiato forçado pelo período em que viveu no exterior como esposa do diplomata Maury Gurgel Valente.


Fontes:
Aprendendo a viver - Clarice Lispector, Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2004.
http://www.claricelispector.com.br/
http://pt.wikipedia.org/wiki/Clarice_Lispector
http://www.releituras.com/clispector_bio.asp

5 comentários:

  1. Que post magnífico!!! é incrível como Clarice está na moda, inclusive a gente percebe na rede. Queria que ela visse como todo mundo está na dela, agora. Ela achava que ninguém a entendia. Este texto tb está no livro que acabei de ler, Aprendendo a Viver, uma coletânea de crônicas geniais. Como presente, te mando este texto, espero que goste. Nos falamos em breve, estou indo pra sampa agora!! :D:D beeeeijo AMO. Dani,

    Rifa-se um coração quase novo.
    Um coração idealista.
    Um coração como poucos.
    Um coração à moda antiga.
    Um coração moleque
    que insiste em pregar peças no seu usuário.

    Rifa-se um coração
    que na realidade está um pouco usado, meio calejado,
    muito machucado e que teima em alimentar sonhos
    e cultivar ilusões.
    Um pouco inconseqüente
    que nunca desiste de acreditar nas pessoas.
    Um leviano e precipitado coração
    que acha que Tim Maia estava certo quando
    escreveu…
    “…não quero dinheiro, eu quero amor sincero, é isso que eu
    espero…”.
    Um idealista…
    Um verdadeiro sonhador…

    Rifa-se um coração que nunca aprende.
    Que não endurece, e mantém sempre viva a esperança de ser feliz,
    sendo simples e natural.
    Um coração insensato
    que comanda o racional
    sendo louco o suficiente para se apaixonar.
    Um furioso suicida
    que vive procurando relações e emoções verdadeiras.

    Rifa-se um coração
    que insiste em cometer sempre os mesmos erros.
    Esse coração que erra, briga, se expõe.
    Perde o juízo por completo em nome de causas e paixões.
    Sai do sério e, às vezes revê suas posições
    arrependido de palavras e gestos.
    Este coração tantas vezes incompreendido.
    Tantas vezes provocado.
    Tantas vezes impulsivo.

    Rifa-se este desequilibrado emocional
    que abre sorrisos tão largos
    que quase dá pra engolir as orelhas,
    mas que também arranca lágrimas e faz murchar o rosto.
    Um coração para ser alugado,
    ou mesmo utilizado por quem gosta de emoções fortes.

    Um órgão abestado
    indicado apenas para quem quer viver intensamente
    contra indicado para os que apenas pretendem passar pela vida
    matando o tempo,
    defendendo-se das emoções.

    Rifa-se um coração
    tão inocente que se mostra sem armaduras
    e deixa louco o seu usuário.
    Um coração que quando parar de bater
    ouvirá o seu usuário dizer para São Pedro
    na hora da prestação de contas:
    “O Senhor pode conferir.
    Eu fiz tudo certo, só errei quando coloquei sentimento.
    Só fiz bobagens e me dei mal
    quando ouvi este louco coração de criança
    que insiste em não endurecer
    e se recusa a envelhecer”

    Rifa-se um coração,
    ou mesmo troca-se por outro
    que tenha um pouco mais de juízo.
    Um órgão mais fiel ao seu usuário.
    Um amigo do peito que não maltrate tanto o ser que o abriga.
    Um coração que não seja tão inconseqüente.

    Rifa-se um coração cego, surdo e mudo,
    mas que incomoda um bocado.
    Um verdadeiro caçador de aventuras que ainda não foi adotado, provavelmente, por se recusar
    a cultivar ares selvagens ou racionais,
    por não querer perder o estilo.

    Oferece-se um coração vadio, sem raça, sem pedigree.
    Um simples coração humano.
    Um impulsivo membro de comportamento
    até meio ultrapassado.
    Um modelo cheio de defeitos
    que mesmo estando fora do mercado,
    faz questão de não se modernizar,
    mas vez por outra, constrange o corpo que o domina.

    Um velho coração
    que convence seu usuário a publicar seus segredos
    e a ter apetulância de se aventurar como poeta…”

    Clarice Lispector

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  2. Ameeeeei!!!
    Dani, você tem razão. Clarice está "na última" moda (rsrs). Tenho encontrado cada vez mais adeptos das obras de Clarice.
    Bem, é imposível não admirar "LA LOBA".
    É verdade, imagine se ela pudesse ver o resultado atual... suas obras sendo lidas, divulgadas e comentadas. Acredito que ela ficaria surpresa.
    Amigo querido, obrigada pelo super presente. Mais uma vez digo que amei!
    Ah! quanto ao resultado da viagem...
    quando estiver chegando lá, lembre do compasso do meu coração, ok? (rsrsr - again).
    Kisses:)

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  3. ''Essa História É Muitoo Boaa ^_^ !
    F.Colombianaa

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  4. Olá F. Colombianaa, tudo bem?

    Sou suspeita p/ falar alguma coisa sobre Clarice... Toda sua obra é interessante e bela!!!

    P.S.: Desculpa pela demora em responder, estive ausente por vários dias...

    Abraço!

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