segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Sou como...


Sou como você me vê.
Posso ser leve como uma brisa
ou forte como uma ventania,
Depende de quando
e como você me vê passar.

(Clarice Lispector)

2 comentários:

  1. Oii Sil. Inevitável não vibrar com as palavras fosforescentes de la loba. Estou lendo, entre outras coisas, um livro de crônicas dela chamado Aprendendo a Viver. Entre muitas obras geniais, achei esta que esconde um sentido tão maior, mas foi escondido atrás de uma goma de mascar. Aprecie! :)

    PS.: Estou com saudades de ti. Certamente não choverá no domingo. Podemos combinar de nos ver na igreja, ou comer algo e colocar a conversa em dia. Terei muitas coisas para contar e sei que você também! Estou naquele aflitivo hiato de espera de resultados. E vc? como anda nessa nova fase? nos vemos mui breve, minha cara. Super beijaoooooo :) love U.


    Medo da Eternidade - Clarice Lispector

    Jamais esquecerei o meu aflitivo e dramático contato com a eternidade.

    Quando eu era muito pequena ainda não tinha provado chicles e mesmo em Recife falava-se pouco deles. Eu nem sabia bem de que espécie de bala ou bombom se tratava. Mesmo o dinheiro que eu tinha não dava para comprar: com o mesmo dinheiro eu lucraria não sei quantas balas.

    Afinal minha irmã juntou dinheiro, comprou e ao sairmos de casa para a escola me explicou:

    - Como não acaba? - Parei um instante na rua, perplexa.

    - Não acaba nunca, e pronto.

    - Eu estava boba: parecia-me ter sido transportada para o reino de histórias de príncipes e fadas. Peguei a pequena pastilha cor-de-rosa que representava o elixir do longo prazer. Examinei-a, quase não podia acreditar no milagre. Eu que, como outras crianças, às vezes tirava da boca uma bala ainda inteira, para chupar depois, só para fazê-la durar mais. E eis-me com aquela coisa cor-de-rosa, de aparência tão inocente, tornando possível o mundo impossível do qual já começara a me dar conta.

    - Com delicadeza, terminei afinal pondo o chicle na boca.

    - E agora que é que eu faço? - Perguntei para não errar no ritual que certamente deveira haver.

    - Agora chupe o chicle para ir gostando do docinho dele, e só depois que passar o gosto você começa a mastigar. E aí mastiga a vida inteira. A menos que você perca, eu já perdi vários.

    - Perder a eternidade? Nunca.

    O adocicado do chicle era bonzinho, não podia dizer que era ótimo. E, ainda perplexa, encaminhávamo-nos para a escola.

    - Acabou-se o docinho. E agora?

    - Agora mastigue para sempre.

    Assustei-me, não saberia dizer por quê. Comecei a mastigar e em breve tinha na boca aquele puxa-puxa cinzento de borracha que não tinha gosto de nada. Mastigava, mastigava. Mas me sentia contrafeita. Na verdade eu não estava gostando do gosto. E a vantagem de ser bala eterna me enchia de uma espécie de medo, como se tem diante da idéia de eternidade ou de infinito.

    Eu não quis confessar que não estava à altura da eternidade. Que só me dava aflição. Enquanto isso, eu mastigava obedientemente, sem parar.

    Até que não suportei mais, e, atrevessando o portão da escola, dei um jeito de o chicle mastigado cair no chão de areia.

    - Olha só o que me aconteceu! - Disse eu em fingidos espanto e tristeza. - Agora não posso mastigar mais! A bala acabou!

    - Já lhe disse - repetiu minha irmã - que ela não acaba nunca. Mas a gente às vezes perde. Até de noite a gente pode ir mastigando, mas para não engolir no sono a gente prega o chicle na cama. Não fique triste, um dia lhe dou outro, e esse você não perderá.

    Eu estava envergonhada diante da bondade de minha irmã, envergonhada da mentira que pregara dizendo que o chicle caíra na boca por acaso.

    Mas aliviada. Sem o peso da eternidade sobre mim.

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  2. Mamma mia!!!
    Dani, amei... Não há jamais como contestar La Loba. Confesso que este é um livro desconhecido p/ mim (pelo menos era, até agora - rsrsr).
    Quanto mais eu leio, mais eu quero conhecer tudo sobre ela... É fascinante!
    Quanto ao aflitivo hiato de espera de resultados, não se desespere... Tudo acontece no seu tempo.
    Uma coisa é certa, o sol ainda brilha em estradas que eu nunca passei... então, faça como Clarice, sinta-se aliviado, siga em frente e confie!!!
    Bjo e até domingo (com ou sem chuva)

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